sábado, 28 de outubro de 2017

Percurso de bicicleta: de Reguengos de Monsaraz a S. Pedro do Corval


No passado Domingo, quando o Sol quente de Outono regressou, fizemos um percurso de bicicleta pelos arredores de Reguengos de Monsaraz.
Esta cidade tornou-se sede de concelho em 1851. A sua história está ligada à agricultura, pastorícia, e,  sobretudo, a partir do século XIX, à produção de vinhos. O núcleo habitacional que lhe deu origem desenvolveu-se a partir da actual Praça de Santo António, onde, no século XVII existiu uma ermida.
Nessa altura, este território estava sob a administração da Casa de Bragança. Denominava-se reguengos que queria dizer terras de Rei.
Começámos por visitar esta agradável Praça com árvores e bancos de jardim, rodeada por prédios do séc. XIX..



Daqui seguimos para a Igreja, uma invulgar construção neogótica dedicada a Santo António. Foi construída entre 1887 e 1912, tendo como arquitecto António José Dias da Silva, que se tornou conhecido por ter desenhado a Praça de Touros do Campo Pequeno. Da torre alongada saem arcobotantes, construções próprias do estilo gótico, que servem para amparar uma parede ou abóbada.



Lá dentro destaca-se um retábulo de talha barroca com a imagem de Sta. Bárbara, que foi recuperado da igreja que existiu anteriormente.



Fizemos uma paragem na cafetaria "O Arado" para tomar o pequeno-almoço.  


Na Praça da Liberdade,  o actual centro de Reguengos, encontra-se o busto de Manuel Augusto Papança. Político do século XIX,  desempenhou um papel importante no desenvolvimento de Reguengos, incentivando a actividade vitivinícola.


Nesta Praça também encontramos, no edifício da Câmara Municipal, o Museu Mestre Batista. José Mestre Batista foi um importante toureiro,  natural da freguesia de São Marcos do Campo. No museu é possível observar o seu espólio,  que integra peças como fatos, jaquetas e selas de tourear. 
Um local onde se pode aprofundar o conhecimento sobre o vinho desta região é a Herdade do Esporão,  uma exploração vinicola privada. 
Porém, o que nos levou até lá foi mais a curiosidade sobre o Centro Histórico. Aqui encontramos a Torre do Esporão, a Ermida de Nossa Senhora dos Remédios e o Arco do Esporão. A torre foi edificada no séc. XV pelo Morgado do Esporão, Álvaro de Vasconcelos. A sua função era sobretudo a afirmação do senhorio e do poder militar. A torre alberga uma exposição de peças provenientes do Complexo Arqueológico dos Perdigões, situado na própria Herdade, bem como uma exposição de rótulos das garrafas criados por vários artistas.


A torre estava fachada, bem como a Ermida de Nossa Senhora dos Remédios, do séc. XVI.  Mais tarde soubemos que,  para as visitar, é necessário agendar.



Subimos ao Arco, um autêntico miradouro sobre a vinha e o centro histórico. 



Aproximava-se a hora-de-almoço e por isso fomos tentar a nossa sorte na Sala dos Petiscos (sabíamos que o restaurante estava fechado ao Domingo).  Disseram-nos que as mesas estavam todas reservadas.



Voltámos então para Reguengos,  onde fizemos uma feliz descoberta: o restaurante Plano B. 
Aqui fomos rapidamente atendidos. Indicaram-nos uma mesa perto da janela e serviram-nos as entradas: azeitonas, queijo e um molho feito à base de azeite (com algo mais que não nos quiseram desvendar:-) para molhar o pão.


Depois sugeriram-nos como prato principal algo bem tradicional: carne de porco ibérico grelhado com migas de espargos. Aceitámos e não nos arrependemos.


No momento de escolher a sobremesa também não hesitámos muito: sericaia com ameixa de Elvas.



Depois desta refeição sentiamo-nos um pouco "amolecidos",  e o calor também não ajudava. Ainda assim continuámos, decididos a chegar a São Pedro do Corval. 
Esta é uma freguesia do concelho de Reguengos, conhecida como o maior centro oleiro do país, onde existem mais de 20 olarias em funcionamento.
Descansámos uns minutos junto à Igreja de São Pedro (séc XIX) e depois caminhámos lentamente pelas ruas com casas tradicionais.





Dirigimo-nos para a Rua da Primavera, onde visitámos duas olarias: a de José Cartaxo e a de Luís Janeiro, repletas de loiças lindíssimas e muito coloridas.


Em algumas peças estão representados motivos típicos do Alentejo, como o pastor, a apanha da azeitona e a vindima. Outras apresentam flores de cores quentes sobre um fundo azul escuro.





Nós escolhemos duas tigelas com uma decoração "menos típica" fotos. 


Daqui seguimos para a Rocha dos Namorados. Trata-se de um afloramento granítico em forma de cogumelo ou útero, com gravuras megalíticas semelhantes a "covinhas".  Tem mais de dois metros de altura e o topo está coberto por muitas pedras soltas. ver placa info.



Estas pedras testemunham uma tradição que se cumpre na Segunda Feira de Páscoa: as raparigas solteiras lançam, de costas, e com a mão esquerda, uma pedra em direcção ao topo da rocha. Cada lançamento falhado representa um ano de espera até ao casamento. Pensa-se que esta tradição está relacionada com um antigo ritual de fertilidade. 
Em anos de seca costuma realizar-se uma procissão que sai da Ermida de Nossa Senhora do Rosário e passa pela Rocha dos Namorados.
Foi esculpida uma cruz com o propósito de criastinizar este antigo rito de fertilidade.




A Ermida de Nossa Senhora do Rosário foi o último ponto de interesse do nosso percurso. Edificada no início do séc. XVI, também é denominada Ermida de São Pedro.  Após o terramoto de 1755, foi reconstruída, adicionando-se a torre sineira. A invulgar Capela Mor manuelina é rodeada por torres cilíndricas com merlões.



Era tempo de voltar para Reguengos, mas como estávamos novamente esfomeados, resolvemos procurar um sítio para petiscar. Andando de bicicleta, acabámos por entrar no Campo de Futebol de São Pedro do Corval, onde encontrámos um pequeno bar.


Debaixo de um alpendre, os jogadores confraternizavam animadamente, apesar de terem perdido nesse dia com a equipa do Redondo. Pedimos duas bifanas, uma garrafa de água e dois cafés.



Comemos calmamente, mas sempre atentos à velocidade do sol. Queríamos regressar a casa antes do anoitecer.




sábado, 21 de outubro de 2017

Road Trip Bética: Ruínas Romanas de Carmona e Itálica

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Anfiteatro de Itálica

Há uns tempos fizemos uma road Trip pela região da antiga Bética, uma das províncias romanas da Peninsula Ibérica que corresponde, actualmente, a grande parte do territorio da Andaluzia e a uma parcela da Extremadura. 
Betis era o nome latino do rio Guadalquivir. Daqui vem o nome desta região.  A sua capital era Colonia Patricia Corduba, hoje Córdoba, onde iniciámos a visita aos "escombros" do império.

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vista de Carmona do mirador do Museu do Conjunto Arqueológico

Chegámos já perto do meio dia. Cansados da viagens de carro, parámos um pouco no Café Ânfora, onde nos deliciámos com um dos pratos típicos desta região: espinafres com grão. 

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espinacas con garbanzos

Seguimos para o Conjunto Arqueológico de Carmona, onde começámos por visitar o Museu. Ficámos a saber que este Conjunto Arqueológico integra a necrópole - um conjunto de túmulos pré-romanos e romanos - e o anfiteatro. 

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maqueta do Conjunto Arqueológico de Carmona


Localizada no cimo de um planalto, no vale fértil do rio Guadalquivir, Carmona cedo beneficiou da sua posição estratégica, garantindo assim uma boa defesa de ataques inimigos, bem como uma abundante produção agrícola. Também era atravessada pela Via Augusta, tornando-se uma das principais cidades da Hispania (Península Ibérica). É num contexto de crescimento urbano, durante a época imperial (séc.I e II d.C.), que se constroem esta necrópole e o anfiteatro.
Subimos ao terraço do Museu, de onde se tem uma belíssima vista sobre a cidade de Carmona, a campina e o Anfiteatro.

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Continuámos, dirigindo-nos para a área da necrópole, onde pudemos observar de perto os diferentes tipos de monumentos funerários e as misteriosas tumbas de Servilia e do Elefante. 

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Os túmulos tartéssios (Tartessos resulta da fusão dos povos que vêm do oriente, sobretudo fenícios, com os indígenas) do séc. VII a. C, são escavados no terreno e depois cobertos com terra.
Os primeiros enterramentos romanos, do séc II a. C., são tumbas de inumação em que o cadáver era colocado flexionado e com a cabeça orientada a Este.
Já as tumbas do início do período imperial, são escavadas na rocha e têm carácter colectivo. É utilizada a incineração.  

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A Tumba del Elefante, monumento funerário do séc. I d. C.,  tem este nome por ter sido encontrada no seu interior uma escultura em pedra com a forma de um elefante.  

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escultura encontrada na Tumba del Elefante, que agora se encontra no Museu do Conjunto Arqueológico
Pensa-se que a escultura está relacionada com rituais religiosos orientais. Também foram encontradas representações de Cibele (deusa da fertilidade, proveniente da Frígia) e Attis (amante de Cibele), pelo que foi considerado santuário de culto a estas divindades. Há ainda um estudo que defende que a Tumba del Elefante, apesar do uso funerário, foi inicialmente construído para ser um templo dedicado ao deus Mitra (designado mitreu), deus persa da Luz, identificado com o Sol. 

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Tumba del Elefante

A Tumba de Servilia, também do séc. I d. C., de influência helenística, é a mais monumental. Lá dentro encontrava-se a escultura de Servilia, uma jovem enterrada nesta tumba e membro de uma família importante. Esta tumba foi dedicada a Servilia pela sua mãe, Polia.
Também é possível observar vestígios de pinturas murais, onde se distingue uma figura humana e uma balança.

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escultura de Servilia que se pode observar no Museu do Conjunto Arqueológico
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a imponente Tumba de Servilia, com a forma de uma "domus", ou casa típica romana
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câmara funerária com uma cúpula escavada na rocha
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vestígio de fresco, representando uma figura humana e uma balança

O anfiteatro, do séc. I a. C., que observámos apenas do mirador do museu, foi parcialmente escavado na rocha, aproveitando a inclinação natural do terreno. Obedece ao esquema clássico de estrutura para realização de espectáculos de gladiadores. Na zona do anfiteatro foram encontradas tumbas de incineração e inumação, pelo que se pensa que também terá sido usada como necrópole.

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Anfiteatro

Terminámos a visita e, já cheios de fome, atravessámos o calor andaluz em direcção ao centro da cidade. Como é habitual à hora de almoço, as ruas ficam vazias e as esplanadas dos restaurantes enchem-se de gente. Caminhámos até à Plaza de San Fernado e, depois de uma rápida "mirada" pelas várias hipóteses, acabámos por escolher o Bar Goya, que já conhecíamos. 

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a caminho da Plaza de San Fernando
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rua que desemboca na Plaza de San Fernando

A maior parte dos pratos andaluzes têm origem árabe. Um bom exemplo é a alboronía, um prato de vegetais, cuja base são as beringelas e a abóbora. Depois do descobrimento da América foram-se adicionando outros ingredientes, como o tomate e o pimento.

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alboronía

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salmorejo

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magret de pato con manzana caramelizada
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Añojo de ternera a la plancha
tocino de cielo

Depois de almoço, viajámos para Santiponce. Ao entardecer, explorámos lentamente o centro e procurámos um sítio para dormir. Ficámos no hotel Anfiteatro Romano, perto de Itálica, com uma decoração que evoca as ruínas. Acabámos por jantar no restaurante do hotel, o Ventorrillo Canario, numa esplanada rodeada por vegetação e esculturas.

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azeitonas "gordales"
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salada de queijo de cabra caramelizado e frutos secos
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salada com molho cocktail
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tarte de café


No segundo dia, depois de tomarmos o pequeno-almoço na cafetaria do hotel - tostadas y café con leche - fomos andando para o recinto das ruínas que é muito maior do que o do Núcleo Arqueológico de Carmona.

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Anfiteatro de Itálica

Antes de começarmos a visita às ruínas propriamente ditas passeámos à beira de um lago.

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Itálica é também uma antiga e importante cidade da Hispânia, que se situava junto do Rio Guadalquivir, perto da actual cidade de Sevilha. Foi fundada por Publio Cornelio Escipión, em 206 a. C. Inicialmente foi local para onde foram destacados legionários que participaram na segunda Guerra Púnica, tornando-se o primeiro assentamento romano permanente no sul da Península Ibérica.
As famílias dos imperadores Trajano e Adriano são oriundas de Itálica. 
Durante o governo do imperador Adriano (117-138 d. C.) adquire o estatuto de colónia e com o imperador Augusto são levadas a cabo importantes reformas e melhorias urbanísticas: é na época de Adriano que se constrói o gigantesco anfiteatro com 25000 lugares, para a realização de espectáculos com lutas de gladiadores e animais. Á semelhança de outros locais em Espanha recentemente foi um dos locais escolhidos para servir de cenário na série Game of Thrones.

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Anfiteatro de Itálica

O anfiteatro é constituído pela arena de planta oval, as bancadas e os corredores subterrâneos ("fossa bestiária"), onde ficavam as jaulas dos animais.

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Depois de visitar o anfiteatro, o percurso levou-nos pelas amplas ruas desta antiga cidade, que chegou a ocupar uma superfície de 52 hectares, permitindo-nos apreciar a paisagem envolvente e conhecer as habitações daquele tempo, como a Casa dos Pássaros, com o seu detalhado mosaico.
Aqui estão representadas cerca de 33 espécies de aves diferentes.

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Outros edifícios decorados com belíssimos mosaicos no solo eram o Planetário e o Edifício do Mosaico de Neptuno. No mosaico do Planetário surgem sete deuses associados a astros, bem como as etapas do percurso solar.

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No Mosaico de Neptuno, este deus encontra-se rodeado por um conjunto de criaturas marinhas: golfinhos, peixes e moluscos convivem com centauros, carneiros e touros transformados em híbridos habitantes do mar.

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A meio do dia, andando sob o sol tórrido, procurámos um restaurante para almoçar. Encontrámos o Gran Venta Itálica, com mesas à sombra num pátio espaçoso.

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sopa de picadillo
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salmorejo
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ternera (carne de vaca)
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tortilla
Voltámos ao recinto das ruínas para terminar a visita. Atravessámos as amplas vias construídas aquando da reforma urbanística de Adriano, que se destinavam ao trânsito rodoviário.

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Passámos ainda pelo edifício da Exedra e pelo Traianeum, ambos do tempo de Adriano.
O edifíco da Exedra, considerado edifício semipúblico, poderá ter sido sede de uma associação cultural ou desportiva. Das suas divisões fazem parte o ginásio e os banhos termais. Sobressaem as colunas do peristilo.

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O Traianeum era um templo dedicado ao culto do Imperador Trajano. Começou a construir-se entre 117-138 (séc II d.C.), mas ficou incompleto. Consiste na junção do templo com um amplo recinto quadrangular, circundado por um pórtico, cuja estrutura arquitectónica é semelhante à da Biblioteca que Adriano construiu na Alexandria.

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escultura de Adriano
Para visitar o Teatro e as Termas Menores, tivemos de caminhar até ao centro urbano de Santiponce.

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O Teatro estava fechado. Observámo-lo do alto do Cerro de Santo António.
Construído no século I d. C., aqui se representavam os géneros teatrais mais populares: as tragédias e comédias. Com 3000 lugares, obedecia ao esquema clássico, com "cavea", cenário, pórtico e orquestra.

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Numa discreta zona residencial do centro de Santiponce surgem as Termas Menores, do tempo de Trajano (98-117). Os habitantes de Itálica dirigiam-se aqui para receberam massagens, fazer exercício ou tomar banhos reconfortantes, mas também para se reunirem e conversarem sobre assuntos tão diversos como negócios e literatura.

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Nestes vestígios conseguimos distinguir o caldarium, o tepidarium e o frigidarium.

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Entretanto, durante o dia, tínhamos encontrado um folheto com a programação de um festival de dança no Monasterio de San Isidoro del Campo. Resolvemos ir.
Este mosteiro foi fundado em 1301 e edificado sobre uma ermida moçárabe. Foi ocupado pelos monjes Bernardos Cistercienses até 1431 que, a partir de 1568, foram substituidos pela Ordem dos Jerónimos.
Em 1603, as águas do Río Guadalquivir inundaram a antiga localidade de Santiponce, que se situava numa zona mais baixa. Então, o prior do Mosteiro concedeu aos habitantes desalojados umas terras que ficavam num local mais elevado, onde fundaram a nova Santiponce, sobre as ruínas de Itálica.
Nesta altura houve vários pilhagens nas ruínas. 

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Arquitectonicamente, este Mosteiro reúne vários estilos,com destaque para o mudéjar. Algumas salas, como a Sacristia, são inspiradas no El Escorial. A obra mais importante é o retablo de Juán Martínez Montañés. Aqui podemos ver pinturas com motivos geométricos mudéjares:

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O espectáculo de dança, intitulado Offlimits, pela companhia Laguilda Obscénica, decorreu a céu aberto, no Claustro de los Muertos. O tema era a bomba atómica de Hiroshima e combinava dança contemporânea e flamenco. A coreografia era acompanhada por música ao vivo e um vídeo com cenas de Hiroshima, que passava num ecrã gigante.
Quando o espectáculo terminou a lua já ia alta. Era noite de lua cheia, uma noite clara. Atravessámos Santiponce, agora animado por jovens nas esplanadas de bares e restaurantes. Já era tarde para nós. Caminhámos rapidamente para o carro e iniciámos o nosso regresso a casa.

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vídeos:

dia 1


dia 2